18/08/2023 | Categoria: Congressos
Vulneráveis precisam ser contemplados na revisão do Código Civil

Durante o “Congresso 20 anos do Código Civil: Avanços e Desafios”, realizado pela Academia Brasileira de Formação e Pesquisa (ABFP), em São Paulo, os palestrantes do painel “Duas décadas depois: avanços e novos desafios do Código Civil” afirmaram que neste momento em que a discussão em torno da revisão acontece é preciso garantir a inclusão dos vulneráveis ao texto.

Coube ao ministro do Superior Tribunal Justiça (STJ), Marco Aurélio Bellizze, a mediação do painel, que teve como expositores a professora Claudia Lima Marques, o professor Otávio Luiz Rodrigues e a professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka.

A exposição teve início com as considerações de Claudia Lima Marques. A professora salientou que embora o Código Civil cite sete vezes o termo consumidor, a palavra vulnerável sequer está presente no texto.

“Como no século XXI, onde os grupos se distinguem tanto, a vulnerabilidade, palavra que quer dizer ferida ou aquele que pode ser ferido, faz falta num Código que é o Código para todos, o Código entre iguais. Mas os iguais são diferentes e essa parte do tratamento dos diferentes tem sido deixada no país”, salientou Marques.

A professora destacou que para a defesa do consumidor vulnerável, se aplica o diálogo das fontes, no qual o Código de Defesa do Consumir e mais o Código Civil serão observados. Para explicar o diálogo das fontes, a professora fez uma analogia.

“O Direito é um edifício, no qual entramos sempre pela mesma porta, os princípios, que são os mesmos: a boa-fé e o combate ao abuso. Nesse edifício, nos andares de baixo temos o Código Civil, que também são os pilares deste edifício. Perto do Sol da Constituição nós temos esses vulneráveis, os consumidores do outro andar, que são os idosos, as crianças e adolescentes, as pessoas com deficiência. Para subir, nós temos que ter a base, que é sempre o Código Civil. Por isso se me perguntam se precisamos atualizar a nossa base, digo que sim. Ela é excelente, um belíssimo Código Civil, mas a sociedade precisa começar a aproveitar mais ainda dessa base e dos seus belíssimos princípios. Não podemos atualizar o Código Civil apenas para a liberdade econômica. Nós precisamos manter a liberdade dos mais fracos e a igualdade dos mais fracos”, asseverou.

Outro desafio, pontua a palestrante, diz respeito ao comércio eletrônico, a LGPD, ao avanço da inteligência artificial, que acabam deixando o consumidor em vulnerabilidade. Embora as relações de consumo sejam pautadas pelo Código de Defesa do Consumidor - que deve abarcar essas temáticas, Claudia Lima Marques argumenta que o Código Civil também deve, na atualização que se pretende, discutir essas temáticas.

Na sequência do debate, foi a vez da exposição feita pelo professor Otávio Rodrigues. Destacou os desafios futuros do Direito Civil Contemporâneo. Argumentou que há um momento de irradiação do Direito Privado, dos Direitos Constitucionais que obrigou a interpretação do Código Civil adaptá-los a novos moldes, mas que não há dúvidas de que existe uma grande defasagem normativa.

“O Direito de Família e Sucessões são campos em que a tentativa de atualização feita nos limites do processo legislativo da época, no início dos anos 2000, não foram suficientes. O problema não é de ausência ou incapacidade de irradiação dos valores, mas a necessidade de modificação sistêmica para adaptar dois grandes livros. As dificuldades no processo legislativo vieram a lume com disfunções no tratamento dessas matérias. Isso, evidentemente, pode e deve ser bem solucionado por aquela que é a personagem central, na minha visão, das grandes transformações no Direito Privado, que é o legislador ordinário”, analisou.

Ao reconhecer a importância do legislador no processo, o professor comemorou o anúncio da instalação da comissão de juristas no Senado Federal para análise da atualização do Código Civil. Conforme anúncio feito pelo presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a efetivação da equipe ocorrerá no próximo dia 24. 

“Trabalhar dentro da ética legislativa de não utilizar uma MP [Medida Provisória] para impor determinadas posições conceituais que eventualmente possam a vir a ser exteriorizadas. O processo legislativo tem todos os rigores do processo do parlamento, a consulta à população, a participação dos tribunais. O produto esperado é compatível com as demandas da nossa época e esse é o elemento mais alvissareiro que Rodrigo Pacheco poderia nos dar. Sinto satisfação por presenciar esse momento”.

Responsável por falar do Direito das Sucessões nos 20 anos do Código Civil, a professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka salientou que esse foi um dos setores que menos sofreu mudanças na instituição do novo Código, efetivado em 2002.

Diante desse cenário, destacou que os tribunais fizeram um excelente trabalho atualizador por meio de jurisprudências nessas duas décadas, uma vez que o “Código em vigor nasceu velho”.

No entanto, Hironaka pontua que essa não é uma característica exclusiva do Código de 2002, mas uma “sina do brasileiro”.

“Os dois Códigos promulgados foram considerados velhos no nascedouro”, rememorou a professora.

Assim como os colegas, a professora destacou a necessidade de atualização do Código, principalmente no que diz respeito às Sucessões.

“Não pode se manter estável, estático, com regras típicas de uma sociedade patriarcal engessada. O Código é produto do momento histórico-cultural. Não se deve desconhecer que a lei tem certa elasticidade, que permite adaptar novos fatos e valores em determinado tempo. Contudo, chega-se a um esgarçamento dos vínculos e normas legais que se impõe perda de efetividade, daí é preciso a substituição da regra. Esse momento se aproxima para buscarmos resolver o déficit crescente em relação à demanda histórico-social do nosso tempo”.

Hironaka fechou seu painel deixando sugestões de assuntos que devem ser pensados no momento das discussões sobre a atualização do Código. Entre elas estão a questão da legitimidade do filho havido de reprodução humana assistida post mortem; ampliação das causas de indignidade para contemplar abandono material e afetivo injustificado, exclusão do genitor condenado por abuso praticado contra o descendente sucessível.

A professora ainda defende que cônjuge e companheiro devem deixar de figurar como herdeiros necessários e seu Direito Concorrencial deve ser limitado às situações de comprovada vulnerabilidade econômica. Já na Sucessão Testamentária, a pesquisadora aponta que deve haver simplificação das formalidades testamentárias e no tratamento dos atos eletrônicos, disciplinando em lei as diretivas antecipadas de vontade.

O ministro do STJ Marco Aurélio Bellizze observou a riqueza de momentos como o proporcionado pelo Congresso no sentido de auxiliar as discussões em torno da atualização do Código Civil.

“O papel da academia é fornecer instrumentos doutrinário, base científica. O dos  tribunais é interpretar, mas o legislador é que deve tratar dos temas sensíveis à sociedade diante de sua representatividade”.

  o autor | Autor: Michely Figueiredo
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