Desafios para a Reforma Administrativa em Estados e Municípios
08/02/2023 | Categoria: Congressos
Não se pode minimizar os desafios da aprovação e da implementação de uma reforma administrativa, ainda que ela se restrinja a extirpar normas ultrapassadas ou exageradas. O ser humano teme mudanças instintivamente. E nós, servidores públicos, parece que temos esse instinto misteriosamente aguçado. Mais ainda: pela experiência, poucas reformas administrativas se distanciaram de um “pacote de maldades”, o que evoca experiências ruins (é preciso, a propósito, calibrar o discurso para evitar demonizar os servidores ou promover um clima de “caça às bruxas”). Mais ainda: mesmo normas que são nitidamente privilégios tendem a ser entendidas ou defendidas como “direitos” que estão “ameaçados”, e é preciso ter cuidado com o tom para se rebater tais “mantras”. Não se pode, de qualquer forma, ser ingênuo e achar que os próprios beneficiários de alguns privilégios serão rápida e magicamente tocados pelo espírito público e renunciarão facilmente às posições conquistadas. Pode haver, até, uma briga jurídica, mesmo durante a tramitação da reforma no Legislativo.
Dentre os principais desafios à elaboração e implementação de uma boa reforma administrativa, podemos elencar, exemplificativamente:
- Obtenção de informações fidedignas e de forma tempestiva: fora do que está disponível por meio de sites e com base na Lei de Acesso à Informação, é difícil obter informações de pessoal no setor público, seja por falta de bases de dados consolidadas, seja pela falta de interesse em cooperar; o ideal é que cada Secretaria integrante do grupo designe um ponto focal, alguém dedicado a responder demandas por informações do grupo que elabora a proposta de reforma;
- Graus variáveis de cooperação por parte dos servidores: os servidores estaduais/municipais são justamente aqueles afetados potencialmente pela reforma; é compreensível que nem todos eles estejam exatamente felizes com a ideia; assim, embora sempre existam servidores comprometidos com as ideias da reforma (especialmente se ela for realmente justa, e não um “pacote de maldades”), eles podem não ser todos, ou sequer maioria;
- Necessidade frequente de parcerias, com respeito à autonomia e às atribuições dos órgãos municipais, notadamente PGE/PGM: justamente por essas resistências internas, é comum que os entes federativos recorram a consultorias externas para a elaboração de propostas de reforma; isso, contudo, tem um custo que nem sempre é baixo, motivo por que a busca por parcerias com entidades do terceiro setor é muito frequente; é preciso que haja, no entanto, espírito cooperativo, para que os servidores estaduais/municipais não sintam suas atribuições “invadidas”;
- Agenda política das autoridades estaduais (timing de apresentação x timing de produção; dificuldades de agenda para reuniões, etc.): grupos maiores ou com mais autoridades de primeiro escalão envolvidas costumam enfrentar problemas de agenda para reuniões, ou de vazamento de informações; o ideal é ter um grupo pequeno, e que as autoridades de primeiro escalão validem apenas as diretrizes específicas e o trabalho final das minutas/avaliação de impacto, ainda que isso seja “quebrado” em várias etapas; o grupo técnico responsável pela elaboração da proposta de reforma pode se acostumar, contudo, a cobranças pela produção e ao estabelecimento de um calendário exíguo: geralmente o timing político é bem mais corrido que o técnico;
- Necessidade de diálogo constante com os órgãos estaduais, notadamente Secretarias de Planejamento, Fazenda e PGE/PGM (onde houver): se o grupo que elabora a proposta não pode ser muito grande, ele também não pode “ignorar” outros órgãos que devem atuar na formulação da reforma, especialmente Secretaria de Fazenda e Procuradoria; em relação a esta última, vale lembrar que, onde existir, tem a competência constitucional para fazer a avaliação jurídica das propostas, ainda que tal não vincule necessariamente o Chefe do Executivo; é de se pensar se não é mais produtivo designar um grupo para elaborar a proposta sem a Procuradoria, que pode se sentir mais à vontade para analisar o produto das minutas “prontas”;
- Limitações políticas (pressão dos servidores, timing): a sabedoria política manda, desde Maquiavel, que a reforma administrativa seja feita de uma vez só, e de preferência no começo do mandato; quanto mais se aproxima a segunda metade do mandato do prefeito/governador, menos provável que a reforma saia do papel; também é preciso lembrar que os servidores públicos são uma categoria sobrerepresentada nos Legislativos, geralmente, e cujo lobby é altamente organizado: convém não subestimar as resistências à reforma, o que faz necessário também traçar uma estratégia de comunicação para o antes, o durante e o depois da tramitação da proposta;
- Definição precisa/realista do escopo, especialmente à luz das condições políticas de aprovação das propostas: quem tudo quer nada tem; é melhor definir precisa e realisticamente o escopo da reforma e conseguir aprová-la, do que buscar alterar tudo e nada conseguir aprovar; em quase todos os Estados, projetos de reformulação completa do Estatuto dos Servidores dormem em alguma gaveta; é melhor, como dissemos, usar o princípio da Pareto e abordar os temas que realmente podem fazer a diferença – isso exige visão política, experiência técnica e capacidade de hierarquizar problemas.
João Trindade é Consultor Legislativo do Senado Federal. Mestre (IDP) e Doutor (USP) em Direito Constitucional. Advogado, sócio do Trindade Camara Retes Barbosa Magalhães Pinheiro Advogados Associados, responsável pelos estudos que embasaram a Reforma Administrativa do Estado do Rio Grande do Sul, em parceria com a Comunitas. Professor dos cursos de Especialização em Direito Constitucional e de Mestrado em Direito e em Administração Pública do IDP.
o autor | Autor: João Trindade Cavalcante Filho
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Doutor em Direito. Mestre em Constituição e Sociedade pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP, 2014). Especialista em Direito Constitucional (IDP, 2011). Bacharel em Ciências Jurídicas pelo Instituto de Educação Superior de Brasília (IESB, 2009). Professor de Direito Constitucional Aplicado da Pós-Graduação em Direito Legislativo do Instituto Legislativo Brasileiro (ILB/Senado Federal). Professor de Controle de Constitucionalidade do curso de Graduação em Direito do IESB. Professor de Estudos de Caso de Direito Constitucional do curso de Graduação em Direito do IDP. Autor de diversas obras, dentre elas “Processo Legislativo Constitucional” (2ª Edição, Editora...
Doutor em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo Uniceub. Especialista em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes. Especialista em Direito Público pela Universidade Anhanguera. Ex-Procurador do Estado do Amapá – Classe Especial, com atuação na área consultiva e nos tribunais superiores em Brasilia (DF). Professor de graduação e pós-graduação em Direito em Brasília. Palestrante e professor de pós-graduação em várias faculdades. Advogado militante, com atuação prioritária nos tribunais superiores e na área de licitações e contratos. Bacharel em Adm...